28 set Qual é a verdadeira liberdade?
Quando nascemos, não somos livres. O bebê não tem, ainda, um Eu e está ligado à mãe. O bebê está imerso na consciência coletiva. Dependendo de cada criança, pode acontecer uma pequena revelação de sua própria identidade, ou seja, uma crise, que a leva ao isolamento e à separação dos outros, produzindo medo na criança. Com essa crise e o medo, nasce na criança a exigência de liberdade, com a determinação firme de não permitir ser reprimida.
Por volta dos seis aos oito anos, muitas crianças se rebelam, recusando-se a obedecer. Na adolescência, se torna evidente a necessidade de independência e liberdade, com a recusa dos condicionamentos compulsórios externos e com a procura da própria identidade.
Na fase adulta, pode ocorrer a supressão do anseio pela liberdade, para viver na sociedade com a profissão escolhida, que é fruto da necessidade de desenvolvimento pessoal.
Caso a pessoa seja adequadamente madura, pode ocorrer outra crise que a impulsionará a recusar os condicionamentos compulsórios externos que a bloqueiam.
Carl G. Jung ensina que há uma possibilidade de libertação e uma verdadeira tomada de consciência de uma realidade profunda, para pessoas que já alcançaram um certo grau evolutivo. As demais pessoas nem se dão conta dessa possibilidade e sofrem uma crise profunda, que pode levá-las a caminhos equivocados ao procurar remédios, inúteis regressões ou adoecimentos psicossomáticos.
Em conformidade ao nível de liberdade e de consciência, nas fases anteriores, o período da velhice é vivido de forma mais ou menos serena e madura. A morte se manifestará de forma natural de libertação e de transformações, para aqueles que conquistaram a verdadeira liberdade interior.
Como compreender o grau de liberdade alcançado?
Por meio do exame das diversas etapas da própria vida, averiguando se o desenvolvimento da autoconsciência e da capacidade de liberdade foram alcançados, de forma gradual e harmoniosa, no decorrer de cada fase.
Trata-se aqui da formação estável do eu e de um sentimento autônomo capaz de gerir a personalidade, e não da conquista da liberdade transpessoal, que vem do Eu.
A liberdade do eu pessoal é impossível de ser alcançada, porque está condicionada pelo determinismo a que estão subordinados os corpos físico, emocional e mental. Esses corpos são constituídos e organizados por meio de influências do ambiente, da educação e das suas necessidades inconscientes não superadas.
Quando se compreende o ser humano somente como a personalidade, este nunca será livre porque possui mecanismos, hábitos e condicionamentos. Porém, quando o ser humano é considerado possuidor de um nível de consciência mais elevada e transpessoal, existe a liberdade humana denominada como “individualidade”. Pode-se considerar o ser humano com duas partes, uma livre e a outra não-livre: individualidade e a personalidade, que através de um processo evolutivo se integrarão na realidade total do Eu.
Para compreender verdadeiramente a liberdade, temos de analisar a nós mesmos para averiguar quais de nossas características estão, ainda, condicionadas e quais delas estão livres.
Precisamos, também, desenvolver a capacidade de atenção e de percepção consciente, para podermos observar os momentos em que não conseguimos ser livres, espontâneos e autênticos, e nos quais conseguimos nos expressar autenticamente.
Com uma atenção plena e consciente, podemos compreender que a verdadeira liberdade é um estado de consciência, assim como a felicidade.
Existem muitos exemplos de pessoas da história da humanidade, que passaram pela experiência da liberdade interior, apesar de terem as liberdades exteriores suprimidas. É como se, ao ser obrigado a renunciar à expressão de si mesmo como personalidade, é que o homem descobre seu verdadeiro eu, e, em uma contradição, se descobre como sendo o próprio carcereiro.
Os condicionamentos, hábitos, instintos, desejos e necessidades nos comandam, quando estamos identificados a eles. Precisamos passar por um processo de libertação, para alcançar a liberdade.
Nosso propósito é conquistar a liberdade, mantendo a capacidade de nos relacionar com os outros, de desenvolver mais amor e senso de unidade.
Em nosso processo evolutivo, cometemos muitos erros, o que faz parte de nossa jornada, e o sofrimento advém em consequência disso. O homem tem de aprender com seus próprios erros, enquanto não percebe sua dimensão interior livre. Quando percebe essa dimensão, o homem a tem como apoio, para auxiliá-lo sobre todos os outros aspectos de si, que estão aprisionados no determinismo. Essa dimensão permite ao homem sentir-se livre, mesmo estando aprisionado, obedecer sem ser escravizado, reconhecendo que existe uma Vontade Superior à qual ele se identifica por livre opção. Assim, nos tornamos livres para deixar a energia divina fluir sem barreiras, com harmonia entre o individual e o universal.
Essa é a verdadeira liberdade.
Anete L. Blefari
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Referência
BATÀ, Angela Maria La Sala – O Caminho para a Libertação do Sofrimento – 10ª. Ed.- São Paulo 2009 – Editora Pensamento